domingo, dezembro 13

Aquela dose esperta de realidade.

- Tia, qué bala?
- Não meu amor, não quero. Psiiuu, volta aqui. Cadê sua mãe?
- Tá em casa...
- E você vai para a escola?
- (Faz que sim com a cabeça)
- Que horas, se você está aqui no farol agora? (12h)
- Mais cedo que isso, ué....
- Sua mãe leva você?
- (Faz que não com a cabeça)
- Ela trabalha?
-(Faz que não com a cabeça)
- E por que ela não te leva?
- Ela fica cuidando da minha irmã.
- Quantos irmãos você tem?
- (Começa a contar nos dedos, apontar os faróis. Cada farol, um irmão.) Sete e uma tá no céu.
- Que céu? O CEU escola?
- Não tia, o céu lá em cima. Minha mãe que disse.
- Ela era pequena?
- Era, era a mais nova, só que daí meu tio jogou um tijolo na cabeça dela e agora ela tá lá no céu.
- (engole em seco) E cadê seu tio agora?
- Tá sentado lá no muro olhando a gente.
- Ele briga se vocês não levarem dinheiro?
- (Faz que sim com a cabeça)
- Você sabe ler?
- (Faz que sim com a cabeça)
- Então lê isso pra mim...
- É que sabe, eu sabia, mas agora não sei mais pq eu esqueci.
- Olha eu tenho que ir, mas vê se você lembra como lê tá bom? E não deixa de ir para a escola, tá?
- Tá bom tia, beijo.

BEIJO.
Especulações inevitáveis: O tio que matou a irmã dela estava cuidando deles, sentando em algum muro, gastando o dinheiro das balas em pinga. Nem devia ser tio, devia ser peguete da mãe deles.

Alguém um dia se interessou em ouvir o que eles tinham a dizer. E eles tinham. E eu estava presente.
O fato é que a gente sabe que isso acontece, mas o contado olho a olho, é aquela confirmação necessária.

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